Dama da Madrugada

Rafael Presto
2 min readOct 13, 2020

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[poesia]

Que olhos bonitos, lobo mau
Quantos anos você disse que tem mesmo?
Não fica com medo, é só um gracejo.
Você é um menino
Mas tem olhos tristes.
O tempo voa, bebê
Um farol reluzente -
O cinismo deixa marcas na alma
E a saudade do cigarro é para sempre.
Te ensino:
A vida é um grande foda-se
Com uns porres e trepadas pelo caminho.
Nada de muito nobre,
Só mesmo essa canja requentada
E alguns cachorros chutados na madrugada.
O amor custa caro, bebê
Dá muito trabalho.
São outras as prioridades
No maço do baralho.
Envelhecer é uma merda,
Nunca se deixe convencer do contrário.
Por isso sou assim hedonista
Enquanto lustro meu calvário,
Esse itinerário enfadonho -
O problema dos antidepressivos
É não lembrar de mais nenhum sonho.
Me arruma um cigarro?
Adoro desses, mentolado.
Tenho sempre a disposição
Algum isqueiro roubado.
Posso chupar sua boca?
Termina seu copo,
Deixa que eu pago a conta.
Fica tranquilo coração
Que é só uma foda.
Nada de caso de amor, crise da balzac, casa com cerquinha.
A tia só quer beber do teu corpo suado
Uma noite a mais de morfina.
Estamos juntos nessa, bebê
Uma madrugada mais perto da morte
Ou com sorte
Uma noite de uivos pra lua.
Me dá a mão, lobo mau,
Vem comigo -
Não sou o pior dos seus erros
Nem você
Meu maior castigo.

13/10/2020

Portrait of a woman with black hair (1914) — Egon Schiele

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Rafael Presto

Poeta de insólitos conflitos, amores aflitos e sonhos de revolução. Escritor, dramaturgo e roteirista — operário das letras cultivadas com afeto e despropósito.